A Terra da Minha
Vida
“Poucas vezes me senti tão honrado em minha vida como me
sinto agora. Aconteceram-me fatos diversos que levaram a mim e aos meus livros
mundo afora. Eles significaram, antes de tudo, Ilhéus. Não só porque aqui
comecei a vivê-los, porque aqui imaginei a escrevê-los, mas porque a presença
de Ilhéus irradiou a luz especial que ilumina essas minhas pobres páginas.
É de Ilhéus que nasce o que de
mais puro e sensível, o que de mais belo possa ter o que escrevi. Ilhéus como
tema me inspirou, me marcou de forma profunda o que escrevi de alma e corpo, as
coisas que quis dizer em todo o meu trabalho literário da decorrência de toda a
minha vida, onde tantas coisas aconteceram e acontecem com aspectos tão
diferentes e diversos à realidade mais distante e, por conseqüência, a
realidade fundamental em Ilhéus.
Vim pra’qui aos quatro anos. Aqui
transcorreu a minha adolescência, vivi minha infância, corri nas ruas solto,
livre, capaz de amar a liberdade sobre todas as coisas, pois a primeira lição
que recebi desta terra foi à lição de liberdade. Ilhéus não é apenas uma bela
cidade do sul da Bahia, com a tradição de luta, de violência, de vida
espantosamente vivida. Ilhéus é bem diferente, é bem mais que isso. É a
transformação de tudo isso em
criação. E a transformação de tudo isso em viva e translúcida
realidade.
Ilhéus para mim significa o
começo e significa a construção posterior. Quando eu, por acaso, ponho os olhos
naquilo que escrevi eu vejo que Ilhéus está criança e aqui me fiz homem, aqui
me fiz escritor e quando eu quero saudar a verdade de mim próprio, aquilo que é
essência de meu ser, de minha vida, eu penso nessa cidade, por mais distante
que eu possa estar geograficamente das suas praias, das suas ruas, da sua
gente.
Essa cidade me acompanha. A cada
dia eu me revejo nela, a cada dia eu me redescubro nela, a cada dia eu me sinto
mais próximo e fundamental de tudo quanto eu fiz. Eu não sei se fiz grandes
coisas. Algumas eu busquei fazer na minha trajetória de escritor, algumas
verdades busquei dizer, algumas realidades coloquei no papel. Tomei delas da
vida para transformá-las em
literatura. Tudo isso se deu porque vivi nessa cidade. A
minha Ilhéus transparece a paixão pelas coisas e pelos homens, o amor infinito
pela vida.
Que dizer mais dessa cidade?
Dizer que a amo de uma forma imensa, infinita. Meu amor por Ilhéus não tem
limites, pois é o amor que vem da meninice, da adolescência, dos tempos felizes
e alegres, dos dias em que eu quis aceitar a verdade da minha vida.
Quero ainda dizer que em nenhum
momento desses acontecimentos que me tornaram conhecido, deixei de me lembrar
/que foi aqui onde tudo começou. Foi aqui em Ilhéus, na praça do Vesúvio, não
foi noutro lugar.”
Pronunciamento de Jorge
Amado ao receber o título de cidadão ilheense em 1997.
IMAGENS: De cima para baixo, montagem com Jorge Amado; Jorge retratado na parede do bar Vesúvio (que foi removida após reforma) e Jorge Amado retratado por Floriano Teixeira.
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