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segunda-feira, 29 de agosto de 2022

REGISTROS NO TEMPO

 


O confrade Cyro de Mattos no lançamento de seu livro "Berro de Fogo", contos, livro de estreia, na Galeria Goeldi, Ipanema, Rio de Janeiro, 1966. O evento contou com a presença do famoso romancista Adonias Filho, à direita.

domingo, 21 de agosto de 2022

NATHAN COUTINHO DO ROSÁRIO - FUNDADOR DA CADEIRA 37, DA ACADEMIA DE LETRAS DE ILHÉUS

NATHAN COUTINHO

Por Cyro de Mattos


Nasceu na cidade de Valença, Bahia, em 22 de agosto de 1911. Muito jovem, recém-formado em direito veio residir em Itabuna, onde se dedicou ao jornalismo, à advocacia e à política. Aqui dirigiu durante onze anos o jornal diário “A Época”, que tinha no seu corpo de redatores os jornalistas Hélio Pólvora e Manoel Leal. Em 1947, eleito para a Assembleia Legislativa do Estado transferiu-se com a família para Salvador onde exerceu como deputado três legislaturas. De 1958 a 1959, assumiu a presidência da Assembleia Legislativa Estadual. Foi nomeado para o tribunal de Contas do Estado no qual se tornou conselheiro.

 É autor do livro de poesias Inquietudes. Sua poesia de bom nível seria mais reconhecida se publicada em jornais de circulação nacional. Aparecia nos jornais de Itabuna e Ilhéus. E assim, impressa nas ilhas literárias do interior, ficou esquecida. Ele era o pai da consagrada contista e romancista Sônia Coutinho e do sociólogo Carlos Nelson Coutinho, uma das maiores autoridades sobre a dialética marxista através do prisma de Georg Lukacs. Filhos de Itabuna, ambos passaram aqui a sua infância, antes de o pai com a família fixar residência em Salvador.

 

Nathan Coutinho foi incluído na antologia Poesia Moderna da Região do Cacau, organizada pelo poeta Telmo Padilha, com dois poemas. Um deles transcrevo agora.

 

O Soneto de Agosto

 

Na sombria mudez de teus dias cinzentos

há soluços de inverno e angústias de sol posto.

És veneno e ilusão… E nos teus céus nevoentos

há o motivo maior de todo o meu desgosto.

Mês das horas mortais e dos minutos lentos,

mês de melancolia e de penumbra… Agosto!

Tu vens ressuscitar a dor dos meus tormentos,

pondo-me crepes na alma e lágrimas no rosto.

 

No lívido palor dos teus dias de calma

com o noturno da chuva a minha dor confortas

e ouço a alma de Chopin a chorar na tua alma…

Quando vens, mansamente, no Nada me convidas:

porque és o mês do tédio, o mês das folhas mortas

– ó mês sentimental das ânsias incontidas!

 

“O Soneto de Agosto” apresenta-se no formato fixo do próprio soneto, o conteúdo tem laivos simbolistas. Sem deslizes na ideia e nos versos, emerge da tristeza e revela as interioridades do poeta através das unidades rítmicas. Um soneto que tem a cor das sombras, da melancolia, como pedia a estética simbolista e que dá uma pequena mostra de quanto Nathan Coutinho era um poeta de qualidades, que sabia se expressar com inconfundível disponibilidade anímica. Ele é um dos patronos da Academia de Letras de Itabuna ( ALITA).


* Cyro de Mattos é membro da Academia de Letras de Ilhéus.


PARA SABER MAIS SOBRE Nathan Coutinho CLIQUE AQUI.

sábado, 13 de agosto de 2022

POESIA


Foto: Jorge Amado no Cana Brava, Ilhéus/ Divulgação


Peripécia de Jorge Amado

Cyro de Mattos* 


Eu te louvo pelos oprimidos

nos subterrâneos da liberdade,

teu pulso erguido com amor

fale da seiva de servos,

calo sem orvalho na trama

do ouro vegetal com rifle na curva.

Teu verde galope sem sono,

na seara vermelha tua face

carregando sede e fome,

o olho do sol crepitando

céu de fogo na aurora,

fósforo aceso no crepúsculo.

Teu riso leonino fendido

com os capitães da areia,

esse trauma de ladeiras

e ruas do mundo sem teto

manchado na hora da ciranda.

Numa tenda dos milagres

toda a Bahia mestiça cabendo,

no sumiço de uma santa

a arte incrível de um feiticeiro.  

Eu te louvo no peito lírico,

a garra de Teresa Batista,

fome de Dona Flor, agreste Tieta,

rosa de Gabriela, cravo de Nacib.

Quem te fez pastor da noite,

Vasco Moscoso, flor do povo,

Pedro Bala, amado guerreiro,

boêmio, malandro, meretriz, violeiro,

guardador de chaves africanas,

verdade absoluta em Pedro Arcanjo,

duas mortes de Quincas Berro Dágua,

gargalhada da Bahia ao infinito?

Ó meu capitão de longo curso,

para te louvar com aplausos,

risos grandes e muitos vivas,  

 tua cidade de mares e santos 

amanhece repetida de foguetes,

de estrelas e atabaques anoitece,

nos terreiros orixás estão descendo.


* Membro da Academia de Letras de Ilhéus, ALITA e Academia de Letras da Bahia.


quarta-feira, 10 de agosto de 2022

HOJE É O DIA DO NOSSO ESCRITOR-MOR, JORGE AMADO. SE VIVO ESTIVESSE COMPLETARIA 110 ANOS!



“Não foi por devoção que Eulália deu ao primeiro filho o nome de santo que batizava a cidade mais próspera. O preferido era santo Antônio, a quem chamava Tonho nas rezas em que lhe pedia a vinda de um varão, e não de uma mulher, mais uma a sofrer. Como Ilhéus deixara de ser chamada pelo nome mais longo — São Jorge dos Ilhéus —, a mãe, que talvez não se recordasse do padroeiro, adivinhava a fama no pertencimento.

 

No registro ficou Jorge Amado. Sem o Leal, da mãe, e o de Faria, do pai, João.”

(Jorge Amado: Uma biografia: Joselia Aguiar, São Paulo: Todavia, 1ª. ed., 2018).

 

Jorge Amado nasceu no dia 10 de agosto de 1912, na Fazenda Auricídia, cidade de Itabuna e faleceu em Salvador, no dia 06 de agosto de 2001.

domingo, 7 de agosto de 2022

ANTONIO BERNARDO VASCONCELOS DE QUEIROZ É O NOSSO PATRONO DA CADEIRA Nº 37


ANTONIO VASCONCELOS DE QUEIROZ 
E SUA VERTENTE POÉTICA

Por Gilson Antunes *

Antonio Bernardo Vasconcelos de Queiroz

Antonio Bernardo Vasconcelos de Queiroz nasceu em 05 de dezembro de 1879, aqui em Valença. Nasceu na mesma casa que foi o berço do seu tio-avô, o estadista do Império, Zacarias de Góis e Vasconcelos. Era filho de doutor Aristides Galvão de Queiroz e dona Maria Benedita Vasconcelos de Queiroz. Realizou os estudos secundários no antigo Liceu da Bahia e o curso superior na Faculdade de Medicina em Salvador, colando o grau em 1902. Foi catedrático de Física, por concurso, do Instituto Normal, transferido depois para o Colégio da Bahia.


Antonio Vasconcelos de Queiroz, homem sábio que marcou sua geração, atuou em Valença, exercendo a medicina e a política. Na vida política, ocupou o cargo de intendente (termo usado até o primeiro quartel do século XX para designar o chefe do poder executivo municipal, hoje prefeito) da Prefeitura durante 06 anos (1916-1922). Já o exercício da medicina, consta nos registros da Almanak Laemmert (76º anno, 2º volume, 1919-1920) seu único nome como médico (entre 1919-20), provavelmente trabalhando no único hospital aí indicado: a Santa Casa. Confrontando os dados supracitados, é bem provável que, ao mesmo tempo em que administrava a cidade, atendia como médico na Santa Casa. 

Na época de sua administração, Valença possuía em torno de 25 mil habitantes, já era iluminada à eletricidade, tinha a maior parte de suas ruas calçadas, era servida por água canalizadas e contava, dentro do perímetro urbano, com cerca de 1.600 casas, conforme dados da Almanak Laemmert. Esse registro histórico ainda assinala uma lista de professores que atuavam na cidade, tanto no âmbito público (estadual e municipal) quanto na esfera particular. Trago esses dados, porque o poema que logo transcreverei analisa o perfil do professor, representando-o de maneira sofrida e sonhadora, como um herói desconhecido que luta, incansavelmente, pelo sustento diário.

Os professores destacados pelo Almanak, na esfera pública foram: 1. Esfera estadual – Guilhermina de Góes, Julia Petit Ferreira, Maria dos Anjos da Fonseca, Marieta Cezimbra Coutinho, Donatilia Guimarães, Rosalina Maria da Fonseca e Antonio Destero. 2. Esfera municipal - Arlinda Torres, Judith Góes, Anna Cathalá Loureiro, Rachel Genoveva Gomes e Adelina Reali. Já na esfera particular, atuava na Escola da Sociedade Beneficente Valença Industrial a professora Helena de Magalhães e tinha como adjunta a professora Maria Fonseca Vasconcelos de Queiroz. Além disso, atuavam como professores particulares Evergisto de Deus, Amélia Messias, Alvina Costa Netto e Dufrosa Freitas. 

O poema que segue, escrito em 1940, segundo Aloysio de Carvalho Filho (1951), é composto por 12 quadras e soa como uma espécie de homenagem ao professor.



PELO SINAL DO PROFESSOR


Distingue-se o professor,

do modo mais evidente,

onde quer que se apresente,

pelo sinal:



É um tipo triste, cansado,

de aspecto pobre e servil:

o mesmo em todo o Brasil

da Santa Cruz.



Sempre queixoso do atraso

nas fôlhas de pagamento...

(Do seu perêne lamento

livre-nos Deus!).



Abandonado da sorte,

só numa coisa confia:

é que desta o leve um dia

Nosso Senhor.



Quando avista um companheiro,

sorri, compassivo, e diz:

- ali vai um infeliz

dos nossos...



Mas não lhe fala: não pode;

é hora de uma lição.

(Quem não souber diz que são

inimigos!)



Não aprecia uma festa,

Um cinema, um recital:

só tem vida social,

em nome.



Sóbrio à força, sonha, às vezes,

com frutas, doce, bebida...

Menos jejum tem a vida

do padre



E neste andar, oscilando

entre um apêrto e um apuro,

como cuidar do futuro

do filho?



Mas trabalha. E para a luta,

que sustenta, dia a dia,

tem que sacar energia

do espírito.



Meio cavaleiro andante,

misto de monge e jogral,

mas nutrindo um ideal

santo!



É um herói desconhecido.

Isso – é mais do que ninguém

Deus te proteja, colega!

Amen. 



Nessas estrofes, saltam aos nossos olhos o perfil do professor traçado pela sensibilidade do poeta. A primeira marca destacada é a de um sujeito passivo, cansado e servil, tipicamente o homem brasileiro. É um indivíduo queixoso e de lamento contínuo, infeliz em sua profissão, em virtude das injustiças que lhe são imputadas. Sem vida social, seu sonho está centrado em alimentos, já que, devido à sua condição financeira, padece de constantes jejuns. Mergulhado nessa miséria financeira, o professor é um ser em luta diária e em contínuas travessias sem norte (Cavaleiro andante, Dom Quixote a alimentar fantasias de um desejo impossível). Trata-se, sob a pena do poeta, de um herói desconhecido, pois, em seu anonimato e em suas injustiças, dedica-se ao trabalho com responsabilidade e afinco, nutrindo um santo ideal. De lá para cá, quase nada mudou. As injustiças continuam, e o professor ainda luta por se tornar um herói reconhecido socialmente. 


REFERÊNCIAS



ALMANAK LAEMMERT. Valença. In: Anuário Comercial, Indistrial, Agricola, Profissional e Administrativo da República dos Estados Unidos do Brasil para 1919-1920. Rio de Janeiro, 76º anno, 2º volume (Estados), p. 2323-2325.

CARVALHO FILHO, Aloysio de. Coletânea de poetas bahianos. Rio de Janeiro: Minerva, 1951.

(*) SILVA, Gilson Antunes da. Antonio Vasconcelos de Queiroz e sua vertente poética. Jornal Valença Agora. Valença, BA, nº 620, 16 a 22 de março de 2017, p.19, 2017.

 

Saiba quem é o professor, doutor em literatura e pesquisador Gilson Antunes da Silva clicando aqui.

segunda-feira, 1 de agosto de 2022

CYRO DE MATTOS PUBLICA LIVRO SOBRE JORGE AMADO

O escritor e confrade Cyro de Mattos acaba de publicar o livro Os saberes nas narrativas de Jorge Amado, reunindo 18 ensaios sobre a obra do famoso romancista, numa coedição da Fundação Casa de Jorge Amado e ALBA, editora da Assembleia Legislativa da Bahia. O livro traz o prefácio “Cyro Mattos e Jorge Amado: um encontro Grapiúna”, assinado pelo professor doutor em Letras Nelson Cerqueira, poliglota, membro da Academia de Letras da Bahia, ensaísta e ficcionista, e o posfácio “Cyro de Mattos pisando chão verdadeiro”, de Ângela Fraga, escritora e presidente da Fundação Casa de Jorge Amador (Salvador). 

Este é o quinto livro de ensaio de Cyro de Mattoso, também é o quinto publicado pela Fundação Casa de Jorge Amado, com o selo editorial Casa de Palavras. Os outros foram Berro de Fogo e outras histórias, Canto a Nossa Senhora das Matas, Poemas Ibero Americanos e Canto até hoje, obra poética reunida, Prêmio das Arte Jorge Portugal, da Fundação Cultural do Estado e Lei Aldir Blanc. Ele já publicou 62 livros de criação pessoal e possui 15 livros publicados por editoras europeias. 

Os ensaios inclusos em Os saberes nas narrativas de Jorge Amado são estes: O menino grapiúna, Romances da juventude, Negro valente e brigão, Mar de amor e morte, Meninos abandonados, Universo do cacau, Incursão em Itabuna, Da caatinga para o desconhecido, Vadiagem e marinhagem, Pastores da noite, Numa tenda dos milagres, Uma flor entre dois maridos, Duas mulheres guerreiras, Uma história de feitiçaria, O romancista acadêmico, O criador de personagens, Prosador e poeta, Autor para a garotada.