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quarta-feira, 10 de abril de 2024

ARTIGO

 



Da Prosa e Poesia no Sul da Bahia 

Cyro de Mattos*


Denominada de Nação Grapiúna por Adonias Filho, a Região Cacaueira da Bahia reúne um elenco valoroso de ficcionistas, poetas e cronistas, que em suas obras se preocupam com o ambiente do cacau, tipos e costumes. Alguns autores são considerados como inseridos nesse contexto nem tanto pelo tema, mas por suas ligações de origem a uma civilização forjada como singular ao longo dos anos. 

De uns anos para cá, a literatura no Sul da Bahia cresceu e se tornou um corpo consistente com autores de obras expressivas, que vieram se juntar aos nomes maiores de Jorge Amado, romancista centrado no tema social e costumes vividos por gentes típicas nas terras do sem fim; de Adonias Filho, dono de uma narrativa elíptica, que com maestria estilística constrói nas letras brasileiras um império de tragicidade, situado na infância da selva, e de Sosígenes Costa, poeta ilheense belmontino, expressando-se com um legado em que esplendem belíssimos sonetos pavônicos e o mito de Iararana.

Esta literatura, que, em alguns casos levou o homem e suas circunstâncias regionais a ser conhecido em níveis nacionais e até mesmo internacionais, tornou-se dotada de um acervo poderoso, integrado de autores e obras que em concepção e execução alcançaram padrões excelentes nos limites dessa compartimentação operacional. Com estilos caracterizados para a expressão do lírico, dramático e épico, não se pode deixar de considerar nesse cenário de uma literatura original, que fala tanto da disposição da alma como da problemática de uma geografia específica, autores como Hélio Pólvora, Telmo Padilha, Jorge Medauar, Sônia Coutinho, Florisvaldo Mattos e Marcos Santarrita, todos eles com um discurso consistente e um imaginário fecundo. 

Portanto, vemos na prosa e poesia no Sul da Bahia um corpo discursivo crítico e criativo com suficiência formal, dotado de beleza e riqueza na ideia, alcançando por isso suma importância como conhecimento da vida. Há nesta usina de legítimos artistas da palavra uma contribuição expressiva que alimenta a expansão do acervo cultural e literário da Bahia e até mesmo do Brasil. 

Uma visão panorâmica e, ao mesmo tempo perspicaz, de autores e obras no seu processo histórico relacionado com a região sulina do Estado apresenta a vinculação da vida ao patrimônio espiritual da sociedade, em constante pulsação e movimento na direção das dimensões de um discurso fundamental da vida. Como forma de conhecimento de nosso ser-estar no mundo, afirme-se, esse discurso aludido brota de um contexto educativo e cultural, inclinado a ampliar-se na medida em que a vida segue. 

Torna-se compreensível que esses autores ligados ao sul da Bahia com suas obras valorosas alcancem merecida ressonância fora das fronteiras regionais. Estudo que possibilite o levantamento crítico e histórico das letras no sul baiano não pode deixar de relacionar certos nomes importantes e fazer a aferição crítica de seus legados. 



Prosa:

Afrânio Peixoto, precursor e pré-modernista, Aleilton Fonseca, moderno contista de emoções e ideias cativantes, Augusto Mário Ferreira, prosador de ficção curta calcado no absurdo e na galhofa; Aracyldo Marques, romancista tendo a ver com o nascimento do Brasil em Ilhéus, Clodomir Xavier de Andrade, narrador do Vale do Rio de Contas com a sua inesquecível e ingênua Pulu; Elvira Foeppel, nas pegadas de Clarice Lispector, com uma linguagem labiríntica no romance Muro Frio e contos no círculo do medo; Euclides Neto, de prosa saborosa, narrativa regional articulada com engenho e arte, Ferdinand Maximiliano von Habsburg e seu importante relato histórico do mato virgem; Fernando Leite Mendes, ilheense mestre da crônica, Hélio Pólvora, na galeria dos melhores contistas no Brasil, unindo o regional com o psicológico no discurso impressionista, sem fazer esforço; James Amado, romancista do Chamado do Mar, de técnica moderna, criador de gente simples na paisagem marinha; Jorge Araújo, ensaísta enorme, dramaturgo exemplar, poeta dos becos conflitantes do homem, Jorge Medauar, como o norte-americano Sherwood Anderson, recria a vida na cidadezinha do interior através da qual se apresentam personagens que vêm à tona com simplicidade e extraordinária empatia de seu criador, Lilia Gramacho, nascida em Uruçuca, antiga Água Preta, autora infantojuvenil, inventa com facilidade as tramas instigantes da adolescência; Ludimila Bertié, autora de biografia importante, rica de investigação e informações da vida e obra de Adonias Filho; Marcos Santarrita, romancista fecundo na imaginação, de trama em profusão através de episódios vividos por personagens marcantes no seu Mares do Sul; Manoel Lins, cronista talentoso do cotidiano na província; Margarida Fahel e suas incursões memoráveis nas dobras do tempo, mesclando domínio histórico e imperturbável narrativa sensitiva escorrida nos Ilhéus do Brasil Colonial; Naomar de Almeida Filho, ficcionista atrelado ao ilógico da vida; Odilon Pinto com suas prazerosas historinhas vivenciadas nos mundinhos do cotidiano urbano e rural, ; Ricardo Cruz, legítimo recriador do mundo real, com temas capturados do erótico e do político, Ritinha Dantas e seu testamento lírico de uma avó inesquecível; Ruy Póvoas, misto de babalorixá e exímio contador de itans, construtor de uma lavra literária que apreende com sabedoria os caminhos da vida, Saboia Ribeiro, outro precursor regionalista, Sônia Coutinho, audaciosa ficcionista, de conflitos e atritos no ambiente crítico da solidão em família. 




POESIA:

Abel Pereira, constante colhedor de haicai, Adelmo Oliveira, poeta inseparável do verso pungente e dolorido, Ariston Caldas, dono da rosa com pétalas tecidas com agruras; Carlos Roberto Santos Araújo e a sua travessia vertiginosa no rio das solidões, Conceição Nunes Brook, poeta de lirismo sedutor, traçado por musa delicada, Firmino Rocha e sua resistência santa na cidadela da poesia; Florisvaldo Matos, poeta magistral, de linguagem atraente, de lastro clássico ajustado ao verso de técnica moderna; Hélio Nunes com pássaros tecendo a esperança e acontecendo no amanhã, Heloísa Prazeres, dona de uma casa onde habitamos em cômodos convidativos para saber o que somos no trânsito do mundo; Ildásio Tavares e seu ditado fazendo pensar nos momentos críticos do cotidiano urbano, Iolanda Costa e sua lira descuidada; Minelvino, o trovador apóstolo, genuína vocação de cordelista do jeito que o povo gosta; Oscar Benício dos Santos, poeta do cacau, de alma evocativa de uma paisagem pintada com as vicissitudes e perdas campestres; Piligra, cordelista de fôlego, focado na vida e obra de Jorge Amado; Renato Prata com o tempo na pulseira sob o enlace arguto da poesia; Rita Santana, competente poeta das alforrias; Sosígenes Costa, poeta singular e plural, clássico e popular, em terras sulinas da Bahia; Telmo Padilha, poeta de voo absoluto, atravessado de solidões nas questões profundas; Valdelice Soares Pinheiro, de versos contidos retirados com excelência de dentro da alma para revelar a vida com as suas surpresas, milagres e espantos, Walker Luna com seu discurso existencialista sequenciado de gritos lancinantes. 

Como reflexo da vida, a literatura continua em rotação. Pela captura de momentos incertos e preocupantes da vida, também merecem referência para uma leitura apurada as produções de André Rosa, Marcus Vinicius Rodrigues, Evando Nascimento, Neuzamaria Kerner, Emmo Duarte, Antônio Baracho, Marcos Luedy, Ramayana Vargens, Antônio Lopes, Kleber Torres, Ceres Marylise, Gustavo Felicíssimo, Geraldo Lavigne, Rafael Gama, Baísa Nora, Aldo Bastos, Heitor Brasileiro, Pawlo Cidade, Ticiano Leony, Nilo Cardoso Pinto, Fernando Sales, Adelino Kfoury, Efson Lima, Carlos Cauê, Jane Hilda Badaró, Gustavo Cunha, Myrthes Petitinga, Gil Nunesmaia, Delile Oliveira, Agenor Gasparetto e Laila Oliveira.

* Membro das Academia de Letras de Ilhéus, Itabuna e da Bahia.

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