Vale a pena um estudo desta obra-prima,na sua integridade. Seguimos o
texto, passo a passo.
Logo de início deparamos maravilhosa figura estilística, em que as
margens do Ipiranga são mencionadas como tendo ouvido o brado retumbante de
liberdade de nosso povo. A figura é a PROSOPOPÉIA, em que seres inanimados
sentem,falam.
A seguir, a expressiva METÁFORA do sol da liberdade. De fato, a liberdade é luminoso sol que possibilita ver e traçar o
futuro, coisa impossível sob o domínio de colonizadores, como os portugueses, que impunham suas determinações ao Brasil
colônia.
Com
a conquista da liberdade, estamos em pé de igualdade, neste particular, com todos
os povos livres. Aqui o poeta dirige-se à própria liberdade,e falando em nome do povo brasileiro, diz-lhe que desafiamos a própria morte, caso seja necessária a luta, um
“braço forte”, para termos a garantia da
conservação de tal igualdade por ela conquistada. E eis outra
figura de estilo muito eficaz: a APÓSTROFE, quando na poesia, no discurso,
invocamos algum ser. Nosso hino
compõe-se de brilhantes APÓSTROFES: Ó pátria amada, terra
adorada, Brasil.
E
surge um momento de êxtase patriótico e
cristão, quando o poeta,ao contemplar o Cruzeiro do Sul brilhando sobre o céu do Brasil, mergulha num sonho
estupendo, onde, em visão planetária, observa um “raio vívido de amor e de esperança”, a baixar sobre a terra.
Voltados,
a seguir, para a extensão do Brasil, 8.515.767 k2, vem-nos à imaginação a figura de imenso, destemido colosso, muito maior por certo que o colosso de Rodes ou qualquer outro, a refletir na própria grandeza o esplendor do seu futuro.
Note
a força desta inversão da ordem lógica das palavras, HIPERBATO: “Dos filhos
deste solo és mãe gentil,/Pátria amada/ Brasil.”
Quando
falamos do Brasil como deitado eternamente em berço esplêndido não nos
referimos ao Brasil como berço de uma gente preguiçosa, sem futuro, como alguns
maliciosamente interpretam, mas ao próprio território brasileiro, como que
acalentado pelas ondas do mar, à luz de um céu profundo; basta conferir o mapa;
neste, o Brasil pode ser considerado,inclusive
como enorme florão a embelezar toda a América, tal qual canta nosso hino.
A
seguir, os inspirados versos de Gonçalves Dias: Teus risonhos, lindos
campos têm mais flores,/ “nossos bosques têm mais vida,” / “nossa vida” no teu
seio “mais amores” - com sugestiva ANÁFORA, repetição de palavras no começo da
frase ou verso: “nossos bosques” “nossa vida”.
Surge
então, com o nome de lábaro estrelado,oportuna referência à bandeira nacional .
Valendo-nos dos inflamados versos de Castro Alves “Auriverde pendão de minha terra,/ Que a brisa
do Brasil beija e balança” ,que citamos por nossa conta, relembramos, com nosso
hino, que a bandeira nacional sugere
“paz no presente e glória” no passado!
Os
três versos a seguir merecem atenção particular. Aqui o poder coercitivo da justiça
é representado por uma “clava forte”,
isto é, uma arma primitiva de guerra.A justiça tem de ser armada, para ser
obedecida.A propósito, não podemos imaginar policiais com palavras carinhosas
dominando a fúria de possessos que incendeiam ônibus e destroem todo tipo de bens públicos e particulares.
Por
estas alturas, é de novo invocada a pátria para afiançá-la de que, se for
necessário, um filho seu não foge à luta. E aqui poderoso HIPÉRBATO : “Nem
teme, quem te adora, a própria morte.” Em ordem direta, e com fraca
expressão,teríamos: Quem te adora , não teme a própria morte. Aqui,a
palavra adorada, como alhures a palavra
idolatrada, significam simplesmente
amada com um amor intenso.
Concluindo: quem dera fosse nosso hino pátrio melhor conhecido e
apreciado!
Parabéns a seu feliz compositor: Joaquim Osório Duque Estrada.
* Prof. Lima ou Antonio Lima Santos, é ocupante da cadeira 29 desta Academia de Letras.